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Este é um momento muito especial para meu Blog, pois um dos Bluesmen mais importantes do nosso país, dedicou seu tempo, para escrever e deixar suas opiniões em relação ao cenário blues do Brasil.
Estou falando de Paulo Meyer, cantor, gaitista e compositor de Blues. Quem nunca viu um Show do mestre Paulo Meyer e sua banda the Burning Bush, não sabe o que é um espetáculo de Blues. O Paulo Meyer é um artista inacreditável, e suas apresentações são maravilhosas.
Bem, chega de confetes e vamos logo ao que interessa. Abaixo temos na integra, todas as palavras do Mestre, boa leitura.
TB: Como surgiu o seu primeiro Blues em português ?
PM: “O primeiro blues?
Parece estranho para mim pensar COMO DEMOROU para o meu primeiro blues em português sair... eu já havia feito vários blues em inglês, eu vivi nos EUA, e sou professor de inglês. Compor blues em inglês é para mim uma coisa muito natural, sai uma letra diferente em cima de qualquer blues que eu estiver ouvindo, e às vezes até sem música, só a música na cabeça mesmo, e várias músicas que não são bem blues(têm a influência da batida, os acordes, mas não necessariamente os clássicos doze compassos para somente três acordes) em português, e eu já era músico profissional, e bandleader, quando saiu o primeiro blues de verdade em português.
O primeiro blues que eu fiz em português foi o Blues Do Catimbau, está no meu segundo CD, que muita gente pensa que é o primeiro, o CD foi gravado em 1998 e se chama Paulo Meyer & The Burning Bush - Cleansed In Muddy Waters, e é um blues que conta uma história, inspirada em fatos mais ou menos vistos e mais ou menos vividos, então saiu fácil porque acho que é uma história que eu tinha necessidade de contar, existem frases que eu acho que tinha necessidade de dizer, como "eu já vi de perto a morte"/"o mal que a gente faz no mundo, um dia vai ter que pagar"/"se você procurar direito, com certeza vai achar... do lado esquerdo do meu peito... um coração que sabe amar"/"ando de sunga no verão, ando de sunga no inverno... esta carne é passageira, mas o espírito é eterno".
TB: Ao escrever seu primeiro Blues em português, você teve algum receio de rejeição por parte do fiel público de Blues ?
PM: "Rejeição por parte do público fiel ao BLUES verdadeiro, tradicional?
Isso nem me passou pela cabeça, porque eu fiquei meio "tomado" pela necessidade que eu sentia de contar a história, e essa necessidade me fez desviar sem medo da temática principal do blues: problemas, mulheres e bebida, e especialmente problemas com mulheres e bebida - mas musicalmente falando, a letra só saiu porque eu peguei um violão, que raramente toco, e tirei dele uma frase musical, um riff ao estilo dos de John Lee Hooker, que vai pontuando a música toda, e a faz soar muito blues, mesmo não tendo os doze compassos tradicionais.
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Agora mesmo escrevendo esta resposta, eu percebo que inconscientemente usei a mesma técnica que uso, inconscientemente também, só depois da música feita eu analiso a letra e me espanto com a quantidade de palavras de uma só sílaba, para compor em inglês e fazer com que a letra se encaixe "gostoso" na música: usar muitas palavras com UMA SÍLABA SÓ, então na hora de cantar cada palavra é uma nota musical.
O refrão, "O MAL QUE A gen-te FAZ NO mun-do, UM DIA VAI TER QUE pa-gar",tem onze palavras de uma só sílaba costurando três palavras de duas sílabas, 17 sílabas no total, acho que são 16 porque "QUE A" soa como uma sílaba só.
O Edson Franco, jornalista da Folha de São Paulo Que deu "BOLA PRETA" para o nosso CD, escreveu que as músicas da banda "soavam como tradução"
O Helton Ribeiro, da revista Blue'n'Jazz, referiu-se à letra dessa música como "Dylaneca", e eu concordo por dois motivos: 1 sou realmente influenciado por Bob Dylan, que admiro mto como compositor e letrista, e 2 a letra é realmente quilométrica.
O Roberto Miller Maia, antigo diretor da rádio Brasil 2000 que tinha um programa na hora do almoço onde falava tudo sobre rock, conhecido pela alcunha de homem-enciclopédia porque "sabia tudo" sobre rock, me disse que essa música é o melhor blues em português que ele já ouviu.
Você vê, as opiniões divergem, vou mandar pra você em mp3 assim que puder para que você possa ter a sua própria opinião" (Nosso Blog está aguardando esse som. risos)
TB: Você prefere compor em Inglês ou português ?
PM: "O primeiro blues EM INGLÊS surgiu há tanto tempo, lá na década de 70, que eu nem me lembro mais como era. (Risos)
Eu prefiro compor em inglês, é infinitamente mais fácil e eu quase invariávelmente gosto mais do resultado; compor em português é um desafio enorme e eu só encaro quando fico "tomado" por algo que é mais forte do que o meu "eu" normal"
TB: Existe hoje alguma banda de Blues brasileira, que tenha sons em português que você goste?
PM: "Eu gosto muito dos dois primeiros discos do
André Christovam, as letras em português são maravilhosas, minha favorita é Dados Chumbados. Adoro
Blues Etílicos, mas não me amarro muito nas letras em português.
Gosto muito dos blues ou quase-blues em português da década de 70, Mutantes "meu refrigerador não funciona", várias músicas do LUIZ MELODIA(primeiro disco), do JORGE MAUTNER são maravilhoras, e têm uma sonoridade muito BLUES. A Gal Costa também estava muito perto do BLUES no disco ao vivo FATAL. CAZUZA é incomparável no tanto que tem a dizer em cada frase.
Um grande abraço de um cara que, como você, aprende sempre com os verdadeiros mestres do BLUES( Sonny Boy Williamson II, Muddy Waters e todos os outros que você conhece bem), Paulo Meyer"