segunda-feira, 26 de abril de 2010

Vozes do Blues com Sherman


Carlos Sherman é uma das vozes mais marcantes do Blues nacional, além de ser um maravilhoso compositor.

Se não bastasse o talento musical que este bluesman possui, ele ainda é capaz de atrair grandes instrumentistas para perto de si e com isso formar grandes bandas.

TB: Conte um pouco da sua trajetória musica. Como você foi parar na estrada do Blues e o que te motiva a continuar nela?

CS: "Nasci no Rio de Janeiro em 1965, e desde os cinco anos, grudei na Grundig do meu pai, escutando Ray Charles, Frank Sinatra, Johnny Mathis, Tony Bennett, Beatles, Stones... E esta foi a minha indução, associada ao fato de que a minha família adorava promover festas sempre regadas à boa música; e tento um verdadeiro show man em casa: o meu pai... Um grande cantor amador mas que já subiu em mais palcos do que muito profissional por aí...

Passei o fim da década de 70 e o início dos 80 em Brasília, em meio à cena musical embalada pelo Paralamas, Legião, Capital, Finis Afrikae, Plebe Rude... Foi estonteante... Mas neste tempo, comecei a tocar violão e preferi o caminho da Bossa Nova, e compus as minhas primeiras músicas, que não vem ao caso neste fórum... Em 1986 desembarquei em Campinas, e formei a minha primeira banda, o “Spiritus”, baseado no significado em latim: “respiração”... Um provocação clara, posto que as músicas vinham diretamente de minha crise existencial em relação ao sentido da vida, e da minha vida... A música “Olhos”, regravada com o BlueSky, vem desta época... A primeira gravação rolou em 1988...

O “Spiritus” durou 3 anos e tornou-se “Anima”, seguindo a mesma linha por mais dois anos... Sempre autoral, discursando contra as guerras, fazendo alusões à história, e questionando sobre o sentido da vida, etc... Um Rock Pop com um pé no progressivo, muito autêntico, honesto e vibrante... Nesta época tocamos com o “Zenith” e o “Rosa Mística”... Tocamos em 7 rádios FMs entre Campinas, Valinhos, Vinhedo, Mogi Mirim e Mogi Guaçú... Fizemos shows em estádios de futebol, no Ginásio da Unicamp, Festa do Figo, Festa da Uva, e todas as casas da região... Foi uma trajetória relevante... Em 1991 gravamos ao vivo no Teatro Camerati em Santo André, produção do Cláudio Nucci... Mas o projeto não vingou, e o Nucci deixou muita gente boa na mão... Neste ano o “Anima” encerrou a sua trajetória...

Fiquei cinco anos fazendo algumas apresentações em voz e violão pela região, e subi no palco de muita gente boa, mas não voltei a constituir banda... De 1996 a 200 houve um vácuo na minha carreira, em todos os sentidos... Sentia-me frustrado pela cena nacional... Somente em 2000, retornei à luta, e dedicado exclusivamente ao Blues... Tendo em mente a proposta de fazer a releitura dos clássicos, além de alguns trabalhos autorais... Evitando o cover e a cópia pura e simples... Tentando agregar valor artístico... Trabalhando sobre instrumentos tradicionais, sem muitos efeitos na captação, mas com muita qualidade audio-técnica na mixagem e equalização... Incluindo backing feminino e um certo groovy... Incorporando também alguns clássicos do Rock e do Soul... Foram várias bandas, sendo que as mais duradouras foram o “Bunkin´Flues” e o “Blues S/A”... O “BlueSky” é o nirvana neste processo...

Apesar de relutar muito na definição do nosso som por rótulos, valendo-me dos mesmos somente como termos de referência, podemos dizer que o “BlueSky” começa no Blues e o céu é o limite... Escorregamos facilmente para o Soul e para o Jazz... O groovy está na personalidade de certos músicos da banda e quero aproveitar isso... Defino o nosso som como o New Blues, ou simplesmente o nosso som... O som do “BlueSky”... Como artistas como John Mayer, Robben Ford, o “BlueSky” evoca o blues e toca com liberdade de expressão...

Uma vez conversava com uma amigo, o Roberto Terremoto, e tratava de apresentar uma sessão de gravação que ainda não havia sido escutada por ninguém... BluesMan de carteirinha, disse ao Roberto que “havíamos traído a essencial do Blues”... Mas o Roberto retrucou “que nada, este som é do caramba... Deixe os meninos brincarem... Deixe esta maravilhosa banda solta”... Tenho certeza de que o Roberto não tem idéia de como as palavras dele selaram o destino do “BlueSky”... Blues sim, mas sobretudo músicos livres...."


TB: Você tem alguma preparação para sua voz, antes de entrar no palco?

CS: "Na realidade sou muito preciosista e perfeccionista em relação à qualquer apresentação... Quando tocamos à noite, sigo um ritual por todo o dia... Acordo bem tarde, durmo bem, como pouco, basicamente frutas e um prato de massa 3 horas antes do show... Tomo sempre um vinho, começando uma hora antes do show... Existe uma falsa mística de que alguns líquidos “aquecem” as cordas, quando na realidade não existe contado entre líquidos e as cordas vocais, posto que elas estão no caminho da traquéia e não do esôfago... Mas o meu objetivo com o vinho, além de relax psicológico, e produzir um relaxamento muscular, e que afeta as cordas... Além disso procuro me exercitar, sobretudo fazendo abdominais e fortalecendo a parte lombar... Antes de entrar em cena, faço um aquecimento rápido diante do espelho, que é bem ridículo para ser citado, rsrsrsrsrsrs... Rola um nha, nha, nha, nha, nhi, nha, nhi, nhi, nhan... Brummmmmmmm...

Com uma super careta, típica do Belting, minha técnica... Tenho um preparador de voz, o Rafael Villar, um grande profissional na área de musicais, e um fantástico ser humano... E nunca me apresento sem o meu Neumann KMS 104, e os meus efeitos TC-Helicon (Equaliser e Compressor auto-tunning, não confundir com auto-tone que faço questão de não utilizar; e um super Reverb Stéreo)... Assim fico independente dos recursos no PA... O meu Mic é “condenser”, mas tem um excelente corte de feed-back... Então tenho voz clara, limpa e bem equalizada... Outro ponto fundamental é escolher onde se apresentar... Já passei do tempo de tocar em qualquer lugar... Sempre visito a casa com antecedência, e não aceito tocar sem uma boa passagem de som... Meu próximo passo é tornar-me independente dos retornos, e ter o meu próprio retorno wireless de ouvido... Este recurso tira a curtição do clima no palco, mas em certas situações é essencial.... O Blues nem sempre primou por bons vocalistas, e a voz saia rasgada, muitas vezes suja... Mas vinha de dentro...

Minha voz também vem de dentro, é pode apostar que vivo em estado de Blues, rsrsrsrsrs, mas trabalho uma estética vocal diferente... Quero primar pela boa voz... Dificilmente vemos um vocalista de Blues... A cena comum é ter um guitarrista, gaitista ou tecladista que também canta... No meu caso, cantar é o fim... Cantar bem, de forma clara... “Endurecer si, pero sin perder la ternura”, rsrsrsrsrsrs... Quero seduzir com o meu canto, quero expressar emoção real com meu canto, quero enCANTAR..."

TB: Alem de um grande vocalista, você é um ótimo compositor. Onde você busca as idéias para escrever suas letras?

CS:
"Agradeço duplamente, e vindo de outro grande músico, e profundo entendedor de música, estes elogios muito me orgulham... Tenho um método para compor... Mas a inspiração nem sempre está lá... Existem fases onde posso produzir três músicas em um dia, e períodos onde não adianta sentar pra escrever que não vai rolar... Normalmente, tenho um tema sobre o qual quero escrever... Este é o ponto de partida, porque a melodia tem que coincidir com o tema... Se o tema é profundo e soturno, a melodia virá melancólica... Se estou esbanjando ternura, haverá uma balada à caminho... Então, com o tema na cabeça, a melodia vem... Quase sempre começo a balbuciar o som do baixo e da batera.... E experimento um fraseado vocal ainda ininteligível... Aí corro pro BlackBerry e gravo o esboço do arranjo com a boca... Fica ridículo, mas é esse o caminho, rsrsrsrsrsrs... Depois corro pro violão e encontro os acordes... Quando estou criando a melodia, também insiro o fraseado e a linha de voz... Sem compromisso vou disparando palavras e idéias... Então quase sempre acho o refrão... Existem situações especial como no caso de “I Wanna Be With You Tonight”, em que a letra saiu de um tacada... E não foi retocada... Também nasceu assim abordagem da voz... Tenho muito orgulho desse som... Que está ambientado nos anos 70, e tem um toque psicodélico... Partindo do conceito de que devemos viver o presente porque não conhecemos as chances de estarmos vivos amanhã... Está baseado também no filme “Remember Me”, ainda em cartaz... A tradução da idéia, da gravação do BlackBerry, dos acordes, e da música para a banda, rolou na hora do ensaio, e só tocamos uma única vez, e esta gravação registra este precioso momento... Estou experimentando algo novo, porque estarei compondo pela primeira com outro músico... Farei letra para as músicas do Marcinho Eiras, importante músico paulistano, também conhecido por tocar na banda do Faustão..."

TB: Com quem você anda tocando? Conte um pouco dos seus projetos.

CS: "Estou tocando com a banda dos meus sonhos... Caras que vi tocar e que pouco a pouco pude integrar ao projeto... Primeiramente fui apresentado ao Paulinho Gomes (Guitarra), que também toca com o Elemento Soul, e daí fomos consolidando a banda, que na verdade contou sempre com as sugestões do Paulinho... Eu já conhecia o David Rangel (Contra-Baixo) que toca com o Tony Gordon e com o Trio de Jazz do Bourbon Street... O David também tocou muito anos com o Nuno Mindelis... Trata-se de um dos maiores contra-baixistas em ação no país, e o Celso Pixinga pensa o mesmo... David estará lançando o seu CD solo ainda este ano... Depois veio o meu irmão Vandinho de Carvalho... Um dos maiores bateras deste país... Um baiano pra lá de paulistano, que começou tocando com nada mais nada menos do que o ritimista Carlinhos Brown...

Excursionando com ele pela Europa e Estados Unidos, na maior turnê de um músico brasileiro... Tocou com João Donato, também excursionando pela Europa e Rússia... Tocou com muita gente boa da MPB, e ainda toca com a Família Lima, Negra Li, entre outros... Nos teclados, temos Michel Lima, que também toca com a Negra Li e Vanessa Fallabela... Michel também é produtor de muitos outros trabalhos...

E assumo os vocais diante deste dream team... Estamos planejando uma temporada no The Blue Bar (http://www.thebluebar.com.br/), e gravaremos todos os shows em áudio e em mesa digital... E finalmente registraremos os dois últimos espetáculos também em DVD... Trata-se do melhor palco da cidade... Inimaginável... E você estará super convidado para a cobertura, ou somente para curtir... Este projeto conta com o apoio do Flávio Sanchez... Estou trabalhando em nosso primeiro CD... Tenho aplicado um formato de “ensaio” gravando sempre em multipista (multi-track)... A idéia tem sido, captar um som orgânico, vivo, ao vivo, e aproveitar os melhores momentos... O formato multipista me permite trabalhar e produzir o som... O formato “ensaio” é o disfarce ideal para tirar dos músicos a preocupação de acertar... E assim acertamos muito mais e com vida... O CD está nascendo deste formato... E estamos prevendo finalizar captações em mixagem/equalização em Abril/Maio, masterização em Maio/Junho, e fazer o lançamento aqui em São Paulo no Bourbon Street, e em Ribeirão e São José do Rio Preto com o pessoal do Vila Dionísio....

A participação do pessoal do Estúdio 500 é primordial, e este trabalho tem sido possível graças ao apoio do Douglas, e ao super Luciano, e toda a galera do 500... Ensaiar e trabalhar no lugar certo e com recursos técnicos e humanos de primeira linha, é parte da receita do sucesso... Também temos sido apoiados por nossa produtoras, a Lucas Shows, capitaneada pelo antológico Herbert Lucas, que entre outras coisas foi o responsável pela vinda de artista do calibre de B.B. King ao Brasil... A Lucas trabalha de forma séria e comprometida, com um “cast” de altíssimo nível.... É uma honra fazer parte dessa família.... E agradeço especialmente à Thaís e ao Beto, o casal mais lindo e competente da cena da produção musical no Brasil..."


TB: Sherman é um grande prazer ter você no blog. Deixo aqui este espaço para seus comentários finais.

CS: "Como dizia Jimi Hendrix, “o Blues é fácil de tocar e difícil de interpretar”... “I was born, in a crossfire hurricane – Rolling Stones”... Obrigado pela oportunidade, um forte abraço, e uma linda vida a todos..."




I Wanna Be With You Tonight (Carlos Sherman)




Got My Mojo (Preston Foster)
Veja mais:

terça-feira, 6 de abril de 2010

Item de Colecionador - Early to Marry do mestre Artur Menezes

Inauguro hoje uma nova coluna no Blog, Item de Colecionador. Neste espaço vou mostrar CDs nacionais, que todo o amante de Blues brasileiro deve ter em seu acervo, e para estrear, nada melhor do que um álbum incrível, desde a arte do encarte e os detalhes sonoros registrados neste trabalho.

Artur Menezes é um Cearense de 24 anos, que mesmo com pouca idade mostra que é muito maduro musicalmente.

O álbum Early to Marry foi gravado no final de 2009, mas teve seu lançamento em março de 2010. Early to Marry é composto por 9 faixas, repletas de swing, malandragem, energia e muita competência.

É quase impossível eleger a melhor música do álbum, mas coloco em destaque três sons.

O primeiro é a majestosa Early to Marry,que dá nome ao álbum. Uma música com muito estilo e que tem um timbre maravilhoso de guitarra. Logo de cara você pode notar que a banda é composta de monstros, que sabem muito bem como se deve tocar o Blues.

Please, give me a chance é um som incrível, com muito swing e um solo de fazer a alma arrepiar. Não existe virtuosismo em nenhuma das faixas, isso é algo que valoriza muito o álbum e principalmente esta faixa.

Um som cheio de energia é a faixa Let me Show you. Aqui o mestre Artur mostra que sabe tudo de guitarra e faz exatamente o que quer com ela nas mãos.

Para finalizar digo, este álbum cheio de elementos, sonoridade e muito bom gosto, deve fazer parte da sua coleção.

Site: Artur Menezes
Para comprar o Album: Blues Time Records